Mindfulness. Guia para entender o treino mental
O tempo em que vivemos é um tempo demasiado acelerado. Há estímulos vindos de todo o lado, opções para tudo e mais alguma coisa, caminhos que levam a que a maioria das pessoas ande perdida, desfocada, desligada. Perdemos a capacidade de nos conectarmos com quem está à nossa volta, amigos, parceiros e até os nossos filhos, porque quando estamos com eles temos a cabeça noutro lado, seja no trabalho ou nas tarefas domésticas.
Estamos presentes fisicamente, mas na verdade não estamos bem ali, estamos em muitos sítios ao mesmo tempo. Não nos conseguimos focar no que nos faz feliz, não investimos no presente, no agora, porque estamos ocupados com o ontem e a pensar no amanhã.
O que é que tudo isto tem a ver com o mindfulness? É precisamente porque estamos a perder o controlo, o foco, porque nos sentimos cada vez mais a falhar, porque somos dominados pela ansiedade, pelo stress, que cada vez mais gente procura a solução nesta prática. Mas afinal o que é o mindfulness e de que forma é que nos pode ajudar a sermos mais equilibrados, focados e menos ansiosos?
O que é o mindfulness?
Embora só se fale muito sobre mindfulness nos últimos anos, esta técnica é milenar, e tem as suas raízes no budismo. Está diretamente ligada à meditação, mas as duas não devem ser confundidas.
O mindfulness pode ser praticado formal ou informalmente. Praticar formalmente é aprender e praticar as técnicas de meditação, dominar a concentração, absorver os princípios, as bases; e praticar informalmente é, no fundo, a aplicação no dia a dia de tudo o que se aprendeu. Por exemplo, na prática formal aprendemos a concentrarmo-nos numa pessoa e num momento, e na prática informal, quando estamos com essa pessoa, aplicamos a técnica para retirarmos o máximo da experiência de estarmos com ela.
Como nasceu o mindfulness?
O termo mindfulness começou a ser aplicado no início dos anos 80, e tem na base o trabalho do professor de Medicina norte-americano Jon Kabat-Zinn, de 76 anos. A meditação apareceu na sua vida quando foi estudar Biologia Molecular para o MIT, em Massachusetts, nos Estados Unidos, nos anos 60.
Foi aí que conheceu o missionário budista Philip Kapleau, que deu várias formações na área. Desde então, Kabat-Zinn não parou de meditar e de aplicar esta técnica para as mais variadas situações do dia a dia. Em pouco tempo, atingiu resultados que o fizeram querer perceber melhor a relação entre a meditação e a ciência.
Em 1979, fundou a Stress Reduction Clinic na faculdade de Medicina da Universidade de Massachusetts e, mais tarde, o Mindfulness-Based Stress Reduction, um programa sem ligações ao budismo que, por isso, pode ser utilizado por qualquer pessoa.
Como é que se pratica o mindfulness?
O mindfulness não obriga a que se frequente um ginásio ou um estúdio e pode ser praticado em casa, no trabalho ou num transporte público, dependendo muito da capacidade e da experiência de cada um. É um treino mental que ajuda a que as pessoas saibam lidar com os seus pensamentos e emoções, que as faz distinguir melhor os pensamentos úteis daqueles que são irrelevantes e só trazem ansiedade, frustração e infelicidade.
É importante, no entanto, que numa primeira fase haja um acompanhamento por parte de um professor certificado que o irá acompanhar no desenvolvimento das capacidades necessárias para que consiga tirar total partido do mindfulness.
Depois, o mindfulness divide-se então em duas fases: a meditação, que pode ser feita em qualquer lugar, em qualquer hora do dia, e a aplicação prática do que se aprende ao meditar, que, uma vez mais, é realizada a todos os momentos, no relacionamento interior e com os outros.
É preciso meditar uma hora por dia?
A meditação não obriga a horários, não tem uma duração definida, e pode decorrer durante breves minutos ou durante horas, de acordo com as necessidades, disponibilidade e motivações de cada pessoa. O processo de meditação é um mergulho interior que vai levar a que consigamos estar totalmente conscientes de tudo o que se passa à nossa volta, das nossas emoções, pensamentos, do nosso corpo, de todos os indivíduos, de todas as ações que estão a acontecer.
É quase como um trabalho mental que faz com que passemos a prestar atenção a tudo, sem nos distrairmos, sem nos abstrairmos do mundo que nos rodeia. Este trabalho mental pode ser feito em qualquer sítio, a qualquer momento, sem precisar de equipamento ou espaço próprio.
Também se pode usar o mindfulness na alimentação?
Há uma ligação direta entre emoções negativas e uma má alimentação, aquilo a que se chama “comer emocionalmente”, e que já foi abordado em diversos estudos*. Muitas vezes, a infelicidade, o stress e a ansiedade levam a perturbações alimentares, a um descontrolo que origina quase sempre más decisões.
O mindfulness, ao ajudar a que se preste atenção ao corpo e se aprenda a refletir sobre as verdadeiras necessidades físicas do nosso organismo, pode também ajudar a um controlo na decisão sobre o que se come e quando se come.
No dia a dia, é possível aplicar técnicas simples que levam a que se coma de forma mais eficaz. Patrizia Collard e Helen Stephenson editaram o livro “Alimentação Plena”, onde falam sobre este tema, e onde alertam para a necessidade de se estar “consciente de tudo o que se come”, porque só assim se consegue “apreciar todos os momentos de uma refeição”. Neste livro, abordam-se os tais pequenos truques que podem ser aplicados, como usar pratos pequenos em vez de pratos grandes (o que ajuda a controlar a comida que se coloca no prato) ou o beber um copo de água antes de cada refeição, que aumenta a sensação de saciedade.
*Mallory Frayn et al, Emotional eating and weight regulation: a qualitative study of compensatory behaviors and concerns, disponível em: https://www.ncbi.nlm.nih.gov/pmc/articles/PMC6137864/
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